Resenha: Devotos de Nossa Senhora Aparecida – Audio Generator (2016)
A gente precisa tomar um certo cuidado na hora de falar de certas vacas sagradas. No caso, a vaca sagrada é a Devotos de Nossa Senhora Aparecida (que doravante será referida apenas como Devotos DNSA), banda do ex-MTV Luiz Thunderbird. Não que eu acredite que existam fãs xiitas da banda, prontos para me linchar em plena Avenida Paulista ou, pior, me jogar hate nas redes sociais. Não é nada disso. A questão é que há uma certa mística e uma reputação por trás do nome da banda e do ex-VJ. Este, Audio Generator, é um álbum de comemoração aos trinta anos de carreira (entre idas e vindas) da banda. Para quem já leu qualquer texto meu, sabe que eu não tenho medo ou receio de falar que eu não gostei de alguma coisa e porquê eu não gostei dessa coisa. Uma das vantagens de ser um mero desconhecido do grande público e escrever para um site que não faz parte de uma grande corporação é que ninguém vai fazer um reels no Instagram dizendo que eu sou um mané e que minha opinião não vale a merda que eu cago. Isso não significa que eu, ou qualquer outro redator deste nobre espaço não tenhamos recebido nossa parcela de mensagens mal educadas de membros de bandas injuriados por que nós não gostamos de qualquer coisa que eles gravaram e lançaram. Assim, eu entendo que você botou seu coração nisso e todos seus amigos disseram que tá massa, mas isso não significa que tenha ficado, de fato, bom.
Então, hoje, me deparei com mais este disco da pilha de discos extraída do baú de velharias da década passada e, pela primeira vez, me senti um pouco receoso que minhas palavras poderiam não ser sinceras. Não digo que me senti intimidado com o álbum ou com as personalidades envolvidas. Sinceramente, eu acho o Thunder um cara bacana, mas não sou dessa geração que cresceu com ele na MTV nos áureos tempos que a emissora era propriedade do Grupo Abril. Eu peguei só o finzinho do tempo dele na casa. Mesmo assim, entendo que é uma pessoa super importante no meio musical brasileiro e que foi fundamental para a formação cultural de muita gente. Muitos amigos meus, inclusive.
Dito isto, Audio Generator é um disco OK. Ele tem momentos bons, momentos regulares e, sim, alguns momentos que eu pulei a faixa fazendo careta para o computador enquanto dizia “meu, isso é uma bosta”. O álbum começa com “Rickenbaker”, uma faixa divertida com riffs verdadeiramente excelentes, no primeiro momento bom do álbum. “Átomo” é interessante. Podia ser uma música ótima, mas o vocal parece mal colocado. Na mesma linda, o fuzz de “Ficando Legal” é incrível, mas os vocais parecem coisa daquela banda engraçadinha do seu semi-amigo que vive te chamando pra ir a um show da banda dele e você sempre arruma uma desculpa. “Suas Regras”, “São Paulo by Day – Trombadinhas” e “Vou ser seu namorado” são bem ruins, e vou me ater a isso. “Pouso Forçado” parece Biquíni Cavadão.
Não, isso não foi um elogio.
Eu poderia listar faixa a faixa do trabalho e passar minhas impressões, mas isso não me parece produtivo. Vamos focar nos pontos fortes. Mesmo nos momentos mais fracos do álbum, o instrumental é irretocável. Destaque para o baterista Paulo Zinner, que comanda as baquetas em todas as faixas, exceto em “Moro na Filosofia”, que emula um Delta Blues e encerra o disco. Aliás, eu tava pronto pra odiar essa última faixa, mas ela é tão fora da curva que não consegui deixar de gostar do quão despretensiosa ela é. Estranhamente, neste álbum que circula por tantas vertentes diferentes do rock — e que até tem uma faixa tipicamente country western (“O Tempo e o Lugar”) — ela funciona. Parece sem propósito, mas está ali. E tudo bem.
Foi aí que, proverbialmente, me caiu a ficha: Audio Generator é um disco irregular, mas honesto. Um trabalho caprichado de músicos que claramente sabem o que estão fazendo. Eles nem sempre acertam — às vezes erram feio —, mas quando acertam, há um brilho inegável. É o tipo de disco que provavelmente vai agradar quem já tem carinho pela banda, mas dificilmente vai converter novos fãs. Eu, inclusive. E tá tudo bem.
Audio Generator – Devotos de Nossa Senhora Aparecida
Gravadora: Monstro Discos
As vacas sagradas da música brasileira erram, mas às vezes acertam. E tá tudo bem.