Resenhas

Resenha: Black Country, New Road – Forever Howlong (2025)

A primeira coisa que me veio à cabeça quando eu peguei Forever Howlong pra resenhar foi “Theater Kids”. A expressão que os americanos, principalmente, usam pra definir a galerinha dramática, estereotipada e nada descolada dos grupos de teatro das escolas americanas não tem uma tradução para o português e eu não quero usar nada potencialmente ofensivo como “virjões” ou “nerdolas” para definir a trupe do Black Country, New Road. Mas é isso: tem algo de profundamente “theater kid” nesse terceiro álbum da banda, e não digo isso como crítica. Muito pelo contrário. Forever Howlong tem um charme meio desajeitado e ao mesmo tempo encantador de quem coloca o coração inteiro no palco, mesmo que o cenário esteja caindo e o microfone esteja dando microfonia.

Trupe parece ser a descrição mais apropriada para o grupo de Cambridge. As canções todas soam como pequenas peças de teatro musical, contidas dentro de pequenas narrativas guiadas principalmente pelas vozes das vocalistas Georgia Ellery e May Kershaw — mas sem deixar de abrir espaço para os outros integrantes brilharem. Cada faixa parece escrita e cantada por um personagem diferente, como se o grupo tivesse resolvido montar um espetáculo onde todo mundo tem sua vez debaixo dos holofotes. O resultado é um álbum caleidoscópico. Cada música carrega uma série de emoções únicas e são todas igualmente sensíveis.

Para novos ouvintes, a Black Country, New Road (e sua vírgula desnecessária) talvez soe como um Belle & Sebastian atualizado e menos depressivo. Para quem já conhecia a banda, Forever Howlong representa uma ruptura radical em relação aos dois álbuns anteriores. Com a saída de Isaac Wood, Ellery e Kershaw assumiram os vocais e, de certa forma, a direção criativa do grupo. A teatralidade continua, mas agora é mais íntima, quase doméstica — como se a banda tivesse trocado os palcos dos festivais por uma sala pequena, com luz baixa e cadeiras de madeira. Os instrumentos elétricos desaparecem, e a tristeza rasgada da voz de Wood dá lugar a uma alegria agridoce, delicada, mas ainda profundamente emotiva.

Enquanto as melodias ganharam um tom menos sombrio, nas letras o conteúdo varia bastante, oscilando entre o esperançoso e o melancólico. O primeiro verso da faixa de abertura, Besties, já dá o tom: “Eu quero estar em qualquer lugar exceto aqui.” A canção é conduzida por uma melodia doce e circular, quase infantil, que contrasta com as palavras de admoestação de uma amiga para outra. Happy Birthday descreve o que talvez seja o pior aniversário que alguém poderia ter. Já a faixa-título poderia ser uma entrada num diário, escrita num dia outonal por alguém que apenas observa o mundo ao redor. As músicas sussurram — mesmo nos momentos de maior volume, com a banda inteira tocando ao mesmo tempo. Apesar disso, elas nunca soam vazias. Parecem frágeis, mas tocam num lugar bem fundo.

Nenhuma faixa aqui se assemelha a Science Fair ou Basketball Shoes. Não há clímax grandioso. Não há catarse em forma de saxofone. Forever Howlong é um álbum mais democrático, frágil e teatral. O álbum todo soa como o terceiro ato de uma peça em que os personagens já desistiram de impressionar a plateia. Agora eles cantam um para o outro, intimamente. É um disco que abraça o silêncio tanto quando a musicalidade, como um monólogo sussurrado no escuro. E é justamente por isso que ele comove tanto.

8.0

Forever Howlong – Black Country, New Road

Gravadora: Ninja Tune

A Black Coutry, New Road abraçou a teatralidade e o folk, e o resultado é cativante.

Alexandre Aimbiré

Alexandre Aimbiré

Estudante de Letras, guitarrista de fim de semana, DJ ocasional, leitor ávido de Wikipédia e escritor de romances de gaveta. Manézinho de nascimento, criado em Porto Alegre e atualmente mora em São Paulo. Como todo bom crítico, já tocou em várias bandas que não deram em nada.

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