Resenha: Royal Dogs – Tattoo You (2016)
“O Rock está morto. O Rock permanece morto. E nós o matamos.”
Assim falou Nietszche, eu acho.
A verdade é que estão tentando matar o Rock desde que quatro rapazes ingleses com cabelo de cuia dominaram as ondas do rádio há mais de meio século atrás. O Rock morreu quando Elvis se alistou. Morreu de novo em Altamont. Morreu com o punk, ressuscitou nos anos 90 pra depois morrer de vez de overdose no fim da década. E agora, enterrado sob uma pilha de jaquetas de couro ecológico compradas na Renner e solos rigorosamente ensaiados pra parecerem espontâneos, o Rock foi de Olavo de Carvalho mais uma vez. Mas, o Rock persiste e muitas bandas continuam fazendo o gênero continuar vivo, mesmo que insistam que ele está morto e enterrado.
O álbum Tattoo You da Royal Dogs não é uma tentativa de ressuscitar o Rock — é o motivo pelo qual ele continua morto. Não tem nada de novo aqui, só um looping eterno de referências recicladas, poses ensaiadas à exaustão e riffs formulaicos. É um álbum que parece querer ofender quem não curte Rock, mas acaba sendo inócuo porque, na verdade, tem medo de ofender roqueiros. É um Rock que tem medo de experimentar, medo de sair da linha. Música feita para gente que acha que Rock é só para quem gosta da ideia do Rock, não da inquietação que o definiu.
São tantos clichês que eu nem sei por onde começar direto. É mais uma banda com um nome canino. Tem tanta banda com “dog” no nome, desde a competente e semidesconhecida Dr. Dog, até o supergrupo Winery Dogs. A falta de originalidade não é só no nome. A faixa-título tem um pick scrape antes do solo. As letras e os títulos são super lugar-comum. Tem até uma faixa chamada “Diss Track”! Quer algo mais poser que escrever uma diss track — uma parte integrante da cultura do rap — e chamá-la de “Diss Track”? O nome do álbum é o mesmo que um clássico dos Rolling Stones! Qual vai ser o próximo? Animals?
Tattoo You não é um disco ruim, de verdade. A vocalista Laila Razzo canta bem demais. Com frequência critico a afinação e o timbre de vocalistas de rock, especialmente de bandas brasileiras, assim como a pronúncia da língua inglesa. Isso não é um problema aqui, assim como a bateria que é super bem gravada e com uma pegada competente. Aí ouço as convenções de “Breakout To Sleaze ‘Em” e os gritos no fundo à Tommy Lee. É tudo tão certinho, tão calculado. É o tipo de música que se orgulha por não ter nada de novo pra dizer desde o Hair Metal oitentista — e, pior, acha que isso é uma virtude.
Os Royal Dogs não estão sozinhos nesse crime. São só mais uma banda entre uma multidão que confunde repetição com reverência. Bandas que usam o passado como molde em vez de influência. Bandas que querem ser “Rock de verdade” como se isso ainda significasse alguma coisa. Se o Rock agoniza, não é culpa do pop, do trap, do papa ou do TikTok. É culpa dessas bandas que tratam o Rock como se fosse um cosplay de si mesmo. Que vestem jaquetas de couro e uma camiseta do CBGB, fumam Marlboro Gold e acham que isso basta. Não basta. Nunca bastou.
Que o Rock não domina mais as rádios é uma verdade, assim como as rádios não são a mídia mais influente desde antes dos supracitados rapazes com cabelo de cuia aparecerem. O Rock está morto. O Rock permanece morto. E quem continua a matá-lo não são os inimigos de fora — são os cover de heróis de dentro.
Tattoo You – Royal Dogs
Gravadora: Monstro Discos
Se eu não tivesse visto uma foto da banda, eu talvez eu teria dado uma nota mais alta…